sábado, 29 de maio de 2010

Revista Veja: Como não fazer jornalismo e como ser enganada sobre o que é Construtivismo! - Parte 1


Como jornalista, sempre desconfiei da Revista Veja. Sempre achei que ela manipula informações. Como professora, sempre achei o Construtivismo uma das melhores concepções de aprendizagem. E para minha alegria, pude comprovar estas duas idéias. Vejamos o porquê.

Na semana de 12 de maio, a Veja publicou uma reportagem que dá vergonha só de ler o título, mas como se não bastasse, ao decorrer do texto, você não sabe se ri ou chora. Um texto mal feito e muito (mal) manipulado (se é que existe boa manipulação...). Ele é comprido, mas podemos aprender muito como não fazer jornalismo e de quebra, discutir sobre a única coisa correta dele: as pessoas não sabem o que siginifica o Construtivismo.

Quando terminei de ler, estava de boca aberta (e não é força de expressão). O texto deixou-me perplexa por sua falta de seriedade. É tanta besteira que vamos ter que ir por partes...

Ninguém é obrigado a acreditar no Construtivismo como verdade suprema, por isto, primeiro vamos discutir sobre a manipulação da informação, o que já dá pra perceber no subtítulo da matéria.

"Seis de cada dez crianças brasileiras estudam segundo
os dogmas do construtivismo, um sistema adotado por países
com os piores indicadores de ensino do mundo"


Numa época em que não temos tempo para nada, o título e subtítulo acabam sendo as coisas mais importantes num texto jornalístico. Logo, devemos sintetizar o que de mais importante há na matéria. Neste caso, o jornalista enfatizou um dado. Mas será que realmente 60% da população brasileira é educada pelo construtivismo?

Ao começar o texto, percebemos que não é bem isto que acontece, como podemos ver no primeiro parágrafo:

"Mais de 60% das escolas públicas e particulares no Brasil se identificam como adeptas do construtivismo". Ora, não é porque as escolas acham que são construtivistas, que são realmente. Isto é óbvio! Tive uma discussão destas na sala outro dia. Um colega de classe defendeu o método tradicional de alfabeticação dizendo que na sua época, aprendeu a ler, e hoje, como as escolas são construtivistas, ninguém aprende nada. E o pior: a professora concordou.

Então perguntei: mas há provas de que as escolas são construtivistas e que por isto, as crianças saem das escolas analfabetas-funcionais? A resposta: não. Este tipo de senso comum que Veja usou. E outra: "dogmas". Gostaria muito de saber quais dogmar são estes? Cadê estes dogmas na teoria de Piaget. Ainda que eles existissem, seria justo colocá-los na matéria, né?

Aí, ele continua a nos confundir, e passa a falar que as escolas não trabalham o construtivismo, mas o que acreditam ser. Veja:

"O construtivismo tornou-se uma interpretação livre de um conceito originalmente racional e coerente. Ele adquiriu várias facetas no Brasil".

Ele poderia ter se redimido aí, mas não é seu objetivo, e solta novas pérolas. Ao continuar, a reportagem usa de uma linguagem estranha para simplesmente falar que ninguém sabe ao certo sobre o tema: "Em plena era da internet, os conceitos do construtivismo parecem ter chegado ao Brasil via as ondas curtas de 49 metros de propagação troposférica, com suas falhas e chiados. Ninguém sabe ao certo como o construtivismo funciona, muito menos saberia listar as razões pelas quais ele foi adotado ou deve ser defendido". Uma das regras do jornalismo é ser direto, coisa que o jornalista não fez.

Mas não para por aí: para explicar um pouco sobre a teoria, o jornalista metido à engraçadinho fala:

"Traduzindo e caricaturando: como não faz frio suficiente na Amazônia para congelar os rios, um aluno daquela região pode jamais aprender os mecanismos físicos que produzem esse estado da água apenas por ele não fazer parte de sua realidade. Isso está mais longe de Piaget do que Madonna da castidade."

Ou seja: o cara fala lá em cima que os brasileiros não sabem o que é, fazem um balaio de gato, mas o que a matéria deixa a entender é que o Construtivismo (verdadeiro) é o culpado? Assim não dá!!!

Num país com milhares de escolas, será que nenhuma é exemplo nesta questão? Será que a Veja não teve tempo de conversar com a professora e doutora em Psicologia da USP, Telma Weisz, que muito tem a nos explicar sobre o Construtivismo?

Preguiça? Ignorância? Manipulação? Só por aqui, se pararmos para pensar, já dá pra levantar uma boa discussão. Então, que as outras besteiras fiquem para a próxima.

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